Policiais Militares denunciam perseguições e violações de direitos humanos
Os parlamentares da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizaram audiência pública nesta quarta-feira, 2/4/2014, para discutir as violações de direitos humanos e perseguições sofridas por policiais militares em Minas Gerais.
Durante a reunião, vários policiais militares fizeram denúncias de perseguição e violações de direitos humanos realizadas por Coronéis da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG). O Capitão Vicente de Cássio Nogueira relatou que a três anos começou os problemas de perseguição por dois comandantes. “Eu venho sendo pressionado, me encontro em péssimo estado, em tratamento médico e psicológico. Tenho 26 anos de polícia, uma ficha intocável, mesmo assim fizeram uma comunicação disciplinar, mesmo eu estando de licença. Eu estava licenciado e fui obrigado a comparecer no quartel, pois minhas licenças não são homologadas”, afirma. Seu advogado, Jorge Vieira da Rocha, explicou que a perseguição começou em 2011, quando o Capitão era lotado no 39 BPM, ele começou a ser constrangido tendo na frente de suas escalas o seguinte teor “dispensado médico”, mesmo sendo sigiloso. Após os fatos, ele foi transferido para a Diretoria de Tecnologia e Sistema. Depois disso, o Capitão pegou licença por cólica renal. Sua licença foi homologada, mas uma semana depois chegou um Painel Administrativo (PA) pedindo para rever a homologação com uma orientação “conforme conversado” com o Presidente da JCS, Cleinis de Alvarenga Mafra Jr, informando os peritos o que fazer.
O Capitão Vicente de Cássio Nogueira foi submetido a perícia, mas a licença foi transformada em dispensa, e foi aberto dois inquéritos, um por deserção e outro por desobediência. Ele foi convencido a se internar no hospital André Luiz, onde ficou por 30 dias no final de 2013, e hoje está lotado no CICOP.
Segundo o deputado Sargento Rodrigues, estas práticas de perseguição são corriqueiras. “Não é a primeira vez que denuncio a Junta Central de Saúde (JCS) apontando as ligações de coronéis que falam que os policiais militares estão dando o “chapéu”, que estão sendo “matrifusos”. Quero dizer da minha alegria em ter o Capitão Vicente de Cássio Nogueira fazendo esta denuncia, pois os policiais militares são seres humanos. Precisamos fazer, urgentemente, uma intervenção. É um escândalo o que a JCS está fazendo”, disse.
Já o médico Alexandre Augusto Vianna Costa foi denunciado no Conselho Regional de Medicina (CRM). “Fui denunciado no CRM devido ao fato de não existir minha especialidade, que é neuropsiquiatria. Passei em três concursos, um para neurologia e dois para psiquiatria, mesmo assim para o CRM eu não tenho ética. Odeio toda forma de perseguição e de ferir”, destaca.
Já a Sargento Sônia de Jesus Samora foi afastada sem solicitar licença. “Passei e ainda estou passando por perseguição. Não pedi licença, mas fui afastada, e não sou paciente da JCS porque não tive 90 dias de licença. Um médico me deu um atestado psiquiátrico, mas ele veio assinado por seis médicos, mesmo sendo apenas um que fez a perícia. Quando estava na ativa, na Ouvidoria Geral do Estado, desentendi com um Oficial e recebi três notificações por falta sem ter faltado nenhuma vez. Isso tem que mudar, é um absurdo”, ressalta.
O Sargento Edson Pereira Campos dos Santos relatou que foi denunciado, por um cidadão infrator no município de Montes Claros, sendo suspeito de gerar “bicos” de segurança na cidade, sendo aberta uma sindicância para apurar a situação. O mesmo cidadão denunciou, também, na Corregedoria de Montes Claros, que o Sargento Edson, o Capitão Dailson e o advogado Rui Pereira da Fonseca, o procuraram, em sua residência e lhe ofereceram R$ 6 mil para executar um Coronel. “Isso nos leva a crer que existe outros policiais militares instigando o infrator a fazer outras denúncias. Acredito que essas informações infundadas, as perseguições, tenham a ver, sim, com outros militares. Por causa disso, hoje me encontro com problemas psicológicos, tomo remédios fortíssimos e faço tratamento psicológico”, disse. Sargento Edson também foi denunciado por ameaçar o cidadão e por formação de milícia em Montes Claros.
Já o Soldado Mateus Eustáquio Cândido e sua esposa Jéssica Neres afirmaram que mesmo interditado judicialmente por esquizofrenia e outros problemas psiquiátricos, ele teve seu afastamento negado. “Mateus entrou na PM em 2007 e em 2008 sua arma disparou e matou um infrator em suas mãos. Desde então, ele começou a ter problemas psicológicos. Hoje ele toma 18 comprimidos por dia, sendo 7 tipos diferentes. O médico, na perícia, o mal tratou, gritando com ele e batendo na mesa. Além disso, a polícia militar não está pagando seu salário, estamos passando necessidades, pedindo ajuda aos vizinhos”, relatou Jéssica Neres, esposa do Soldado Mateus. “O cardiologista disse que eu estou de birra, mas fui diagnosticado com surto-psicótico e esquizofrenia”, afirma.
Em seu relato, o Capitão Marcos Soares Gandra deixa claro que sofreu assédio moral por seu superior. “Meu caso começou em 2012, na Gerência de Assistência a Educação Escolar, quando fui assediado moralmente pelo Major. Ele enviava mensagens falando que eu estava sendo omisso e conivente com erros. Entrei com todos os recursos internamente, mas um comandante não discorda do outro. Eles acham que estão exercendo um reinado. Depois de 26 anos de polícia militar, com conceito A50, sem nenhuma punição disciplinar, tive que tirar licença de 30 dias para fazer tratamento psicológico”, afirma.
O Vice-Presidente da JCS, Major Marco Túlio de Aquino, afirmou que de janeiro de 2013 à março de 2014 foram realizadas 6797 perícias, totalizando 463 por mês. Ele discordou da Sargento Sônia Samora e afirmou que sempre há mais de um médico nas perícias. “É um setor delicado. Toda vez que temos uma negativa há questionamentos. Houve uma denúncia gravíssima aqui, jamais terá apenas um perito na sala, sempre há pelos menos dois. Os casos são avaliados sequencialmente e sempre há reuniões para discutí-los. Não reformamos ninguém em três dias, há uma sequência, sendo passado por um crivo”, disse.
O deputado Sargento Rodrigues destacou que há uma enorme interferência dos coronéis nos atos dos médicos. O parlamentar afirmou que esperava uma postura mais firme, de ética, dos médicos. “O que esperávamos de um médico é uma postura de não aceitar essas interferências. Se eu fosse médico, não teria coronel nenhum que mudaria meu parecer”, destaca.
Para a Coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Direitos Humanos do Ministério Público, Nivia Mônica da Silva, deverá ser realizado um debate maior sobre o assunto. “A minha proposta seria de aproximar e fazer um debate de procedimentos e protocolos que permitam mais garantias que os policiais militares sejam tratados com mais respeito, como todo cidadão merece”, ressalta. A Promotora ressaltou, ainda, que o Ministério Público está acompanhando a temática há algum tempo. Segundo ela, várias coisas foram faladas, muitas situações diferentes, mas que o Ministério Público deve ter acesso aos autos. Os casos individuais são difíceis de serem tratados no MP, mas podem configurar assédio moral.
Sargento Rodrigues faz um apelo a Coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Direitos Humanos do Ministério Público: “O apelo que faço para a senhora é que comece a provocar os seus colegas para que instaurem inquéritos. Precisamos que o MP abra procedimentos, apure os fatos, pois temos casos graves, concretos, de perseguição”, disse.
Segundo o Ouvidor de Polícia do Estado de Minas Gerais, Rodrigo Xavier da Silva, a ouvidoria só tinha ciência de dois, dos sete casos tratados na reunião. Ele também afirmou que sempre estão prontos para ouvir as graves violações de direitos humanos dos servidores militares.
A comissão de direitos humanos realizará nova audiência pública, a requerimento do deputado Sargento Rodrigues, para que o presidente da JCS seja convocado para dar explicações. A comissão também enviará as notas taquigráficas da audiência aos convidados, ao Comandante-Geral da PMMG, à Corregedoria da PMMG, aos conselhos federal e estadual de Medicina, às comissões de direitos Humanos da OAB-MG, a Promotoria de Direitos Humanos e ao Conselho Regional de Psicologia.
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